20110516

Bilbau, País Basco O chapéu de feltro repousava, cruzando a pena. Sentado, ocupava um lugar esquecido pela idade. Incapaz de de se agarrar ao varão, deixou-se ficar. Por respeito, ninguém comentou; sorriam, educadamente. A medalha de Santa Teresinha, em tons azuis cerâmicos, mantinha um brilho espectral. Pingente numa volta apertada, usufruía, assim, não da graça divina mas da protecção solar proporcionada pela sombra da barbela, ou duplo queixo como este gosta de ser chamado. O pescoço farto e agnóstico, marcou uma linha roxa a toda a volta, delimitando a sua área de opressão. No corredor – isto, para aligeirar a conversa e dispor bem - um tema musical repartia-se por duas orelhas que fantasiavam sobre como os braços daquele fio condutor se iriam entrelaçar, no fim dos dedos. Eis que, mesmo em frente, toma forma uma mulher vulgar, recortada pelo pórtico da escola de freguesia. Pela força com que se abraça à carteira, só podemos imaginar duas coisas: ou ali se esconde, num forro descosido, o rendimento mínimo que lhe garante a família por mais alguns dias, ou este desespero vem da súbita tomada de consciência de que ela própria só existe na forma dos cerca de meia dúzia de cartões que se alinham naquela bolsa contrafeita. Todos os olhares vão agora alternando na direcção de uma lata de cerveja que tamborila um tema alegrete. De dentro dela tinha já saído um génio bem tocado que dissertava, para quem o quisesse ouvir, sobre o miserabilismo destes tempos de antena. Atentemos neste personagem, por mais alguns instantes, na esperança de perceber a fonte da nossa distracção quando temos no colo aquele capítulo mais complexo traduzido do ligúrico.

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